Cheguei exausta.
Subi e me lembrei de uma possibilidade relaxante das melhores que conheço. Um Bom Banho de Banheira.Mas não seria este um Banho qualquer. Seria assim. Com letras maiúsculas.
Preparei um ritual.
Acendi velas em volta. Apaguei as luzes. Coloquei um incenso mais afastado. Fiz um chá. Até mesinha e banquinho ficaram a postos compondo o cenário. Em cima dela, da mesinha, o mini DVD. O russo tocando cello. Divino. O ambiente. O russo também. Lógico.
Enchi a banheira com água bem quentinha. Desliguei o telefone. Que alegria poder decidir e comandar estes pequenos mimos. Foi o que pensei ao me deitar na banheira.
Lá fiquei. Nem lembro mais quanto tempo. Tempo foi o único detalhe que deixei fora do cenário. Fechei a porta e o deixei de fora. O espaço estava mais que suficiente. Adoro quando separo esta parceria de espaço e tempo. Só isso já relaxa. Ela dizia que deveríamos ter um botão. Para desligar os pensamentos. E assim descansarmos.
Acho que quase encontrei o tal botão.
Chega. Agora sim. Relaxada. Tranqüila. Ainda na banheira - puxei a tampinha. Para que a água escoasse aos poucos - comigo ainda dentro. Para que a minha pele fosse se adaptando.
Já quase esvaziadas. Ela – a banheira - da água. E eu - a suposta madame - do cansaço. Sai. Da banheira. Coloquei o pé no chão. Do banheiro.
Confusão mental.
Outra banheira. Não entendi muito bem de imediato. É preciso um sacolejo para que o raciocínio acorde quando está descansado. Ou vai ver desliguei o tal botão. E demorei a encontrar o lado certo de ligá-lo de uma vez.
Toda aquela maravilhosa água saíra não para o – digamos assim - continenti hidráulico. Saíra para o piso. O chão. Do banheiro. Algo acontecera e a água saíra para longe do lugar devido. Direto para o indevido. Estava inundado. Inundado. Mais uma vez me senti num desenho animado. Meus pés e mãos – hirtos - colados no teto. Meus olhos com as molinhas saltadas para fora. Mas mal deu tempo do tal desenho. O ideal seria mesmo correr atrás do prejuízo.
A mesinha foi tirada às pressas. Era uma mesinha antiga que ela tinha me deixado antes de ir para além-mar. Temi pelo fim. Da mesinha. O fio do mini DVD quase se dispunha a eletrocutar o russo e o tal cello. O incenso dançava apagado sobre as águas. O tapetinho afundado ainda se oferecia à função ao lado da banheira. Mas nem tudo acaba por aí. Deixei as velas de lado e fui acender a luz. Luz. Muita luz. Para ver bem o estrago. Pela porta a água saía em direção à escada.
Corri. O mais que pude. Munida de vassouras - rodos e paninhos. Corri para conseguir conter – a tempo - aquele dilúvio invertido.
Em meio ao corre-corre me deu a impressão de que escutei um risinho. Vindo não-sei-de-onde. Conclui. Deve ter sido o Tempo que eu tinha deixado de fora. Com o Tempo não se brinca. Ele não tem bom humor. E nem se entende solitário. Quer sempre ficar grudado em nós. Aprendi.
Lembrei do texto. Ele falou que primeiro você caminha. Depois as águas se abrem. Vai ver que foi porque corri. Não se abriram. Ficaram mais juntas.
Enfim acabei. Pisei em terra firme. Sentei na cama. E fiz a única coisa possível. Naquele momento. Ri. Cai de costas de tanto rir. As cenas e cenários. O cansaço e o relaxamento. A música russa e a enchente americana. O incenso indiano e o apelo bíblico. Ri. Muito.
Quando ele chegou olhou em volta. Viu vassouras e baldes. Paninhos. O chão meio úmido. Eu rindo sozinha na beirada da cama. Sábio. Nada perguntou. Nada comentei.
Saímos para jantar. Chovia.